quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Depressão artística

O povo português é triste. Chavão que até a esta alma banal e empedernida causa agonia e arrepios, e não dos bons como se nos tivessem a lamber a orelha. Orgulhosamente ostentamos a bandeira da saudade, como se fossemos os únicos a senti-la. Apregoamos alegremente a soturnidade do fado como se de uma boa canção de blues se tratasse. Nada contra. Eu próprio fico mal disposto de cada vez que entro na loja do cidadão. O bom humor mascarado nas caras carrancudas (muito bem mascarado e escondido, por sinal) já é tão genuíno como o torcicolo natural do Horacio (ler com sotaque inglês). Toda a taciturnidade, atribuída do alto da nossa melancolia, a quem nos rodeia só espera por uma boa queda, um rasgo de sol ou apenas por um sorriso para esmorecer. Mas eu sou diferente. Não sou vítima dos meus genes, nem tão pouco do estado do tempo. As minhas preocupações não são fúteis. Sofro da auto-diagnosticada e por mim baptizada “Depressão Artística”. Um taxista a enfrascar cerveja numa tasca é triste, quiçá deprimente se o Benfica tiver perdido. Já uma pessoa como eu afogar-se em whisky no seu sofá de couro enquanto ouve Jeff Buckley e reflecte sobre grandes temas que nunca terão solução, como as relações, fé ou o lugar do Aimar no onze do Benfica, emana estilo. Ou acordar às 17h da tarde para percorrer a casa de boxers e esperar pelos Morangos, tal como no dia anterior, e no anterior ao anterior, em ciclos cada vez mais apertados e asfixiantes. Se eu tentasse mudar a situação e não conseguisse caí a máscara. Eu não tento mudar. É uma melancolia contida e realizada. Se desperta em mim um sentimento de negrume incontido, um rasgo de desespero sofrido, eu agradeço, porque dá-me profundidade, concebe-me toda uma aparência de alma maltratada, incompreendida. Procuro ter problemas mesmo que o único tormento tenha sido o churrasco de porco do Zé (não é o Zé que é porco) (o churrasco de porco do Zé (não é o Zé que é porco) é muita bom, aconselho vivamente, só que passado meia hora transforma-se na pior experiência de digestão, principalmente se tiverem comido a cebola toda). Vejo-me assim transformado em alguém cuja paciência esgota-se em segundos, deprimido, mesmo consciente de não existirem razões para isso, cansado do mundo e com vontade de gritar. Tudo isso cria uma aura de mistério e tormento, que por sua vez provocam preocupação nos demais que teimo em rejeitar. Eu estou bem (isto é só para o estilo, acrescento para mim). "Finge tão completamente/Que chega fingir que é dor/A dor que deveras sente", não fosse o outro a adiantar-se e isto não teria aspas. O sofrimento não tem de ser insuportável nem necessariamente malfeitor. É como aquelas pessoas que gostam de ser chicoteadas. Com aqueles chicotes de cabedal. Fininhos. Com coisinhas nas pontas. Não com demasiada força, a dor não pode ser muita, apenas o suficiente para achar a vida miserável (mas não brutal ou cruel) e depois voltar para o escritório. Ou escrever coisas destas. Digo eu.

7 comentários:

Anónimo disse...

Por acaso sempre pus em causa aquela ideia da inutilidade do sofrimento. Acho que, moderado, é muito útil, nem que seja para permitir que nos presenteies com textos magníficos como este:)

Bjinhos, Marianne

P.S. óptima escolha, o Jeff Buckley. Claro que depois tb tens o Devendra Banhart, eheh

S. G. disse...

em grande estilo....o porco do zé, a vantagem de um sofrimento comedido e ainda o gajo que se adiantou naquele maravilhoso poema...

grande post

abraço

(só para que saibam que estou prestes a assinar um contrato com o fontes do ídolo :)

Anónimo disse...

É a segunda vez que escreves "chicote", num curto espaço de tempo...


Texto fantástico, maravilhoso!!!

Gostei das dicas :)

Beijinho, Flora

Unknown disse...

Who da fuck is Devendra Banhart? Agora tens amigas estrangeiras, não é? Quanto ao resto, este texto é uma merda! Uma merda, mesmo! Tipo o bolo de chocolate que o Moela mamou no Zé sem sequer oferecer ao pessoal! É mesmo gosma, o caralhete! E oferece porrada à homem "em frente à namorada" ké pa mostrar... 'Tá armado em Jorge Jesus dos bolos de chocolate!

Mestre Chou Riçá disse...

1 - Qualquer dia compro mesmo o vinil que está na fnac...:D

2 - Traidor!!!!

3 - :D :D :D

4 - Não sejas malcriadão, sua besta da presunção e gabarolice. Vai insultar os teus leitores e deixa os meus em paz oh palhaço. Muito me admira que tão sublime e culta personagem não conheça Devendra. Quiçá uma rápida pesquisa no site que tão amorosamente recomendas te possa iluminar, assim, antes do início da próxima semana já podes colocar qq coisa que se oiça no(s) teu(s) belogue(s). beijinhos

S. G. disse...

um gajo vem a estes blogs que andam ligados à máquina, com posts quase mensais, tentar dar uma força, e ainda é insultado...

vai mas é ver os morangos e o caaminho rebelde malandro...e deixa de estar até essas horas naquele antro do bolo de chocolate...malandros...

Anónimo disse...

Eu sei quem é, meu merdas! Pertence a um vasto grupo de desocupados que por conhecerem meia dúzia de músicas não-americanas se julgam os novos beatniks, ou o caralho! só que cá por cá é mais conhecido pelo "indivíduo que andou no strucla com a Natalie Portman"... Percebes? E, já agora, era bom elucidares a tua amiga, muito cuidadosa na colocação das vírgulas, que comparar este indivíduo com o Jeff Buckley é uma heresia digna de um Rui Santos em preocupante estado de nefasta ebriedade...

P.S.- eu vou pôr a "remember" em tua homenagem, ok?